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Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

“Quem é porco na aldeia é porco em Lisboa.”
E querem saber quem disse? Foi Pedro Xavier? E querem saber quem é Pedro Xavier? Ninguém como todos nós. Ninguém, que conheci na minha infância, e que já deu há muito deu ou emprestou a alma ao Criador, coisa que nos acontecerá a todos, com muita, pouca ,ou nenhuma vontade.
O Pedro Xavier quando o conheci era um ancião, ou cota como se diz hoje, com a sabedoria simples de quem já tinha perdido a cor dos cabelos. Pertencia ao ramo pobre dos Xavier, os grandes lavradores lá na aldeia. No entanto, dava-se ao luxo de possuir viatura própria, um carro com motor de um cavalo, chamado macho Silvestre, e tracção às quatro patas. Coisa rara, porém, naquele meio, em meados do século XX. Uma vez, por mero acaso, tive o privilégio de ser passageiro desse veículo.
Aconteceu num dos anos em que me deslocava com a minha avó, a umas termas improvisadas no concelho de Mértola. O Pedro Xavier também levava a sua dama, apesar de muitas vezes andarem de candeias às avessas, a esses banhos para fortalecer a ossatura. A propósito, numa das vezes em que Pedro estava em modo de separação do leito conjugal, correu nas redes sociais da língua afiada, que iam “fazer as pazes”, em sessão pública, para que não houvesse dúvidas. E lá foi o povo a assistir e comprovar o acto.
Na viagem para ao banhos no Alentejo profundo, eu e avó, viajávamos na camioneta da carreia até Mértola e depois fazíamos o resto do percurso por estrada de terra, cheia de buracos e pedras soltas, montados em duas patas. Alguém se encarregava de levar no lombo de um burro, os utensílios com os quais montávamos tenda rudimentar para nos servir de abrigo.
O Pedro Xavier e a sua cara-metade, em fase de apaziguamento, iam na sua viatura. Calhou encontramo-nos em Mértola e foi-me oferecida boleia naquela geringonça até ao destino. Ó meu Deus, ainda hoje me doem os ossos, dos solavancos daquela viagem. Mais fui forte, não dei o braço a torcer, aguentei firme. O que nunca entendi foi porque razão a mulher do Pedro Xavier ia tratar das maleitas, se ainda arranjava mais durante a viajem.
Na época da sua juventude Pedro Xavier saiu do horizonte fechado da sua aldeia, de saco às costas, para conhecer mundo. Sei que nessas deambulações em procura de sustento, esteve também na capital. No regresso às suas origens, onde decidiu passar a sua vida, até que esta o abandonasse, não trouxe riqueza mas sabedoria. Percebeu que não são os locais que mudam as pessoas na sua essência E daí a proferir a frase que o imortalizou naquele pequeno meio, com significado muito mais amplo do que a sua leitura literal sugere. Talvez por isso, não fosse inocente o seu acto público de estabelecimento de pazes no seu meio familiar. Talvez por isso mereça,ou tavez não, viver nas letras desta crónica, como exemplo da nossa condição de cromos com alma portuguesa.

 

 

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