A eternidade na arte
Os jogadores de cartas é um tema recorrente na pintura de Cézanne, pintor que nasceu em 18 de Janeiro de 1839. Para além do estilo, das escolas, das técnicas interessa-me na arte pictórica a sua capacidade de me despertar sensações momentâneas, sem grandes elaborações racionais.
Este quadro, sem menosprezar a sua beleza estética transporta-me para vivências longínquas de um mundo que ainda conheci . Esta cena, era comum na taberna da aldeia onde cresci. Constituia um acto lúdico de fuga a um quotidiano duro e difícil.
A taberna, local proibido a mulheres e crianças, era onde o homem se reunia com os seus pares, longe da rotina familiar e se cimentava o espírito de agregação social. Ali entre uma partida de cartas e uma rodada de copos, realizava o seu ritual de diferenciação, no contexto de uma sociedade fortemente hierarquizada onde o papel masculino assumia uma preponderância relevante. Ali se desenrolavam as conversas de homens, como noutros espaços se desenvolviam as das mulheres. E era na conjugação e intersecção destes espaços que se organizava o dia a dia destas comunidades quase desaparecidas.
As comunidades de proximidade estão a desaparecer, as tabernas em extinção, a estratificação social por idade e sexo a esbater-se, os rituais de convívio a cosmopolizar-se. Fica para memória futura a imagem de uma sociedade sem retorno, com os seus encantos e a suas misérias. E a recordação e imortalidade de um passado também nosso, devemo-lo à sensibilidade de muitos cézannes.
MG