Dormindo com o inimigo
gritodascinco.com.br
Portugal tem desde o seu nascimento dois tipos de portugueses. Os que sonharam e acreditaram na sua viabilidade, uma maioria e um pequeno grupo ruidoso que sempre pôs a causa a sua existência como nação independente e soberana. Submersos no pântano do esquecimento, esquecidos em esconsos subterrâneos vêm à superfície como ratos esfaimados, ressurgem das trevas, em períodos de dificuldade. Temo-los visto, especialmente, em épocas de crise, desde a deriva fernandina até às invasões francesas, passando pelo domínio filipino.
Nos tempos conturbados de crise financeira e de valores, aí os temos de volta. São os profetas do quanto pior melhor, os reis do descrença, os castrados da confiança. Para essa pequena elite com todos os focos a emoldurar-lhe a silhueta sinistra, Portugal não tem futuro, os portugueses não são capazes de se auto-governar. Eles são os donos da verdade, eles têm a receita mágica para pôr a nação e os cidadãos na ordem. É uma receita recorrente e radical na qual entra, sempre, o condimento ácido dos agiotas com uma pitada de FMI. Este apregoado repasto tem sempre um sabor amargo: mais desemprego, mais desigualdade, mais miséria, mais fome...
Portugal resistiu ao longo da sua existência e provou que sabe e pode sobreviver. Não é fácil resistir a pressões poderosas vindas do exterior, com o objectivo de nos pôr de cócoras perante o poder da especulação financeira e da hegemonia política. Ainda é mais difícil quando a defesa é minada do interior. É uma batalha quase ciclópica de David contra Golias, mas que pode ser vencida.
Portugal tem dívidas, teve dívidas e terá dívidas, mas não é um pais caloteiro. Com mais ou menos dificuldade honrou os seus compromissos e continuará a honrá-los. Precisa de alterar políticas, produzir mais, consumir moderadamente. Precisamos todos de acreditar e remar na mesma direcção, contra os adversários externos, contra os vasconcelos da história, contra os inimigos de alcova.
MG
PS Eles pensavam que Portugal iria afundar-se hoje, mas ainda continua a respirar. A oferta de dívida pública foi menor que a procura. Os juros até desceram, mas não se iludam, vão continuar a empurrar para o abismo.