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Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul


Numa casa portuguesa fica bem, pão e vinho sobre a mesa. E se à porta humildemente bate alguém, senta-se à mesa com a gente. Fica bem esta franqueza, fica bem, que o povo nunca desmente. A alegria da pobreza está nesta grande riqueza de dar, e ficar contente...

... Basta pouco, poucochinho p'ra alegrar Uma existência singela... É só amor, pão e vinho e um caldo verde, verdinho a fumegar na tigela.  

 

Uma Casa Portuguesa Poema de Reinaldo Ferreira e V. Matos. Música de Artur Fonseca

 

Este poema sintetiza a ideia da pobreza no Estado Novo. É uma pobreza assumida como uma bênção do destino. Não é importante o que está sobre a mesa. Importante é a associação da felicidade com a singeleza, expressa no ter pouco, poucochinho. A pobreza é apresentada como um objectivo de vida. Ser pobre, possivelmente, o contrário de ser rico, é estar alegre, é viver contente. A teoria do pobrete mas alegrete voltou à agenda do dia na ideologia do governo PSD, com o "temos que empobrecer". É como um regresso às origens, uma assunção da verdadeira alma portuguesa, vendida à ilusão do bem estar.

 

Esta visão idilica da pobreza divulgada pela propaganda do regime não correspondia na prática à realidade dos pobres. A justificação está nos milhares de emigrantes que abandonaram as quatro paredes caiadas e rumaram a paragens menos alegres na esperança de juntarem ao pão e ao vinho sobre a mesa, aquilo a que chamavam algum conduto.

 

Como escreveu Filipe Luís na Visão, no artigo Brincar aos Ricos, Cristina Espírito Santo cultiva a imagem romântica e pitoresca de quem nunca viu um pobre. Se a dita senhora quer brincar aos pobrezinhos tem de viver nem que seja apenas um mês com o ordenado mínimo, numa casa sem luz, água e instalações sanitárias. E/ou trabalhar oito ou mais horas por dia numa fábrica têxtil, e/ou juntar-se aos grupos de vietnamitas que laboram nas herdades alentejanas. Até lá Cristina Espírito Santo continua a brincar às brincadeiras a que sempre brincou e que por ignorância, confunde, com a pobreza que nunca conheceu.

 

MG