Amor às livrarias
Livraria Lello, um local de culto, com o seu altar. Imagem NET.
Na aldeia onde eu nasci não havia livrarias, mas havia livros. Na casa do meu avô, alguns, na pequena biblioteca da escola, mais alguns, na biblioteca itinerante Calouste Gulbenkian, muitos mais. Foi aí que começou a minha relação com os livros, sempre aberta, curiosa, expectante.
Nem nas pequenas vilas concelhias as livrarias eram vulgares. Quando muito, havia papelarias que vendiam alguns livros. Se quisesse entrar numa livraria tinha de ir a uma capital de distrito, onde existia uma ou outra. Mas livrarias de grande dimensão só se mantinham nas maiores cidades. Assim o contacto com os livros não era nada fácil.
Apenas quando passei a residir na capital do país é que tive oportunidade de ter acesso a uma livraria digna desse nome. No entanto, nessa altura as livrarias eram muito diferentes do que são hoje. Mais intimistas, mais personalizadas. Recordo as da baixa lisboeta, algumas já desaparecidas. Recordo os velhos alfarrabistas. Recordo a antiga Barata nas avenidas novas.
Hoje, os livros, ganharam carta de alforria e estão ao alcance do leitor nos ditos supermercados, em convívio com detergentes, bolachas, ou bebidas. É aí que melhor sobrevivem à escassez de locais próprios de venda. Mas, para mim, o encontro com livros continua a ser nas livrarias. E embora elas se insiram nos grandes espaços de consumo, continuam a fazer-me o apelo de sempre. Ali começa o meu encontro com o livro, o primeiro bate-papo, que muitas vezes acaba em união de facto, quando o trago comigo como um amigo para a vida. Ali me perco e me encontro, nas páginas de um livro aberto.
A livraria é como a igreja para o crente. Um local de culto ao saber, preso no papel impresso, mas ao mesmo tempo livre para ser descoberto por qualquer leitor interessado. Uma religião aberta, sem dogmas, sem credos, tão livre, como o livre pensamento.