A crise da natalidade não se nota na presença de mulheres nos mais diversos serviços. Ainda bem. Em escolas, em hospitais, no comércio, nas compras parecem-me sempre em maioria. Além disso estão cada vez mais bonitas. Mas, modéstia à parte, os homens não lhe ficam atrás. Na pastelaria onde vou tomar café o serviço é prestado exclusivamente por lindas senhoritas. É , foi e será. De quando em vez há renovação de pessoal e lá vêm novas caras larocas
A última aquisição dessa pastelaria chama-se Lili, Veio com os primeiros odores do verão. Com mesma simpatia, a mesma eficiência, mas completamente diferente das suas antecessoras. A empregada que me atendia antes era para o rechonchudo, ligeiramente loira, reservada e tirava-me um café leve e delicioso. A Lili é morena, expansiva qb, e um símbolo de elegância. É tão magra, que parece transparente. Quando se desloca não anda desliza, e serve-me um café mais denso, mais pesado que contrasta com a leveza do seu ser, mas também delicioso.
A Lili encanta-me com a sua simplicidade a roçar a ingenuidade. Já conhece o meu gosto e a nossa comunicação dispensa palavras. Olhares, sorrisos e cumplicidades . O actual estado passou, contudo, por um processo de conhecimento gradual. Primeiro fazia-lhe o meu pedido com todas as letras, depois eu começava a frase e ela acabava-a, ou seja "quero um carioca cheio"..." com adoçante" acrescentava ela muito depressa para mostrar que fazia progressos. Agora é como se nos conhecêssemos para a eternidade.
Admito que não sou propriamente jovem. O cartão de cidadão não me deixa mentir. No entanto, o meu espírito recusa-se a assumir essa realidade. A Lili não precisa de artifícios para assumir a juventude. É mesmo jovem. Mas quando os olhares se fundem desvanece-se essa diferença. Melhor, quando os olhos se confundem, sinto que retornei ao tempo de todas as ilusões. A Lili não se limita a servir-me um saboroso e quente café. Aquece-me a existência e permite-me saboreá-la com os sabores dos frutos proibidos.
Um dia a Lili, partirá, como a Cláudia, a Catarina entre outras. Vou ter pena. Do seu sorriso, do seu olhar doce, do seu andar ondulante e até de uma ou outra expressão de disfarçada tristeza. Guarda-la-ei num recantinho da memória. Depois, virá outra Lili, e começará tudo de novo. É assim a vida, um carrocel de encontros e desencontros. Nova corrida nova viagem até que o carrocel não traga mais lilis. Apenas a ausência de qualquer memória.
MG