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Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

15 Abr, 2013

Números

Nas análises de economistas, nas descrições de políticos, na retórica de comentadores o mundo não é feito  de pessoas de carne e osso. O mundo compõe-se de números, a realidade trasveste-se de estatísticas. Os governos não administram sociedades compostas por cidadãos. Os governos gerem universos aritméticos. Falam de milhares de de desempregados, aludem a percentagens de cortes salariais, de redução de subsídios. Falam com a mesma ligeireza com que se faz a  estatística de um jogo de futebol, por exemplo. Ostracizam a palavra fome, esquecem-se do termo desespero, desconhecem o drama que encerra o conceito de miséria.

 

Mas ao contrário da situação gente das camadas dirigentes, dos satélites que borboleteiam à sua volta atraídos pela luz dos seus holofotes, dos que papagueiam austeridade como quem toma um drink depois de uma opípara refeição, os cidadãos que alimentam as suas equações sofrem na pele os efeitos da condição de marginalizados do banquete da indiferença. Os cidadãos que vêem as suas dispensas sem alimentos, que olham para as prateleiras cheias das lojas sem lhes poder chegar, que sentem o cheiro da comida dos restaurantes cada vez mais vazios. Para qualquer observador atento não são algarismos, nem logaritmos. É gente infeliz com mais ou menos lágrimas. Sofrem, passam frio, têm fome.

 

Mais um ponto percentual no desemprego não é uma banalidade estatística. São milhares de pessoas que podem não ter uma côdea de pão para pôr na mesa. São pais e mães desesperados, são filhos não contabilizados na crueza dos números oficiais. É dificil compreeder a insensisibilidade do poder no inicio do século XXI. Só se pode entender, de facto, no seu isolamento matemático, na sua negação de milhares de anos de evolução humanista.

 

MG    

Parêntesis na crise. Sobretudo na crise de confiança. Principalmente no desânimo. Hoje é Domingo. Hoje a Primavera deu, finalmente um arzinho da sua graça. Hoje o Sol libertou-se das amarras das nuvens, brilhou e aqueceu sorridente, os nossos dias cinzentos. Hoje, voltemos a recuperar alguma alegria, soltemo-nos dos pés de chumbo(leia-se carpideiras da desesperança) que teimam em nos amedrontar. Hoje, ganhemos asas de sonho e fujamos do caminho de expiação (que não merecemos) em que nos querem manter prisioneiros. Hoje, pintemos a vida de arco-iris.

 

Parêntesis na análise política e na penitência económica. Esqueçamos por um momento que vivemos num país ocupado. Libertemo-nos da condição de reféns de interesses obscuros. Façamos de conta que não existem loucos que continuam a empurrar-nos para o abismo. Sonhemos com utopias de justiça e de bem estar. Acreditemos que toda a iniquidade terá um fim.

 

Parêntesis nas angústias induzidas por génios da tortura. Inventemos o nosso próprio caminho, percorrendo-o sem medo. Olhemos as flores que despontam descuidadas, livres e felizes por existirem. Amordacemos a sisudez que nos plantaram na alma e tenhamos a coragem de sorrir. Para a menina solícita que nos serve o café. Para o vizinho que passa apressado. Para quem quiser e acreditar que o sorriso vence quedas depressivas.

 

Apenas hoje, façamos um parêntesis. Boicotemos as notícias da pantalha informativa. São sempre más. Libertemos os olhos das caras recorrentes que nos perseguem. Dos futuros trágicos que nos prometem. Das chantagens que nos condicionam. Sejamos verdadeiramente livres. Hoje, porque é Domingo, amanhã porque será outro dia. Depois, porque gostámos de o ter feito. Hoje podemos ser poucos, mas dia após dia, podemos ser uma multidão que caminha confiante. Parêntesis a parêntesis.

 

MG

11 Abr, 2013

País cativo

Portugal continua cativo

 

 

 

A troika não previne e ameaça o Governo, ameaça os portugueses, os políticos portugueses, a democracia e o Parlamento português, porque Governo e troika são a mesma coisa, falam com a mesma voz. A voz da troika é a voz do Governo, ambos danados porque alguém, neste caso o Tribunal Constitucional, pôs em causa a sua liberdade de fazer o que quer sem respeito por eles, troika e Governo, o mesmo sujeito.
(…)
A nossa tragédia nacional é ter um Governo que não é nacional.’

 

 

Pacheco Pereira, em revista Sábado

 

 

Quem não se lembra na sua infância daqueles meninos birrentos que quando os afastavam de uma brincadeira ameaçavam: "vou queixar-me ao meu pai". São estes meninos, que travestidos de adultos, dizem ser o Governo de Portugal. Concordo com Pacheco Pereira. Não são. São os paus mandados e assumidos de uma entidade internacional que nos usurpou a independência. Daí que rejubilem, quando representantes dessa entidade nos ameaçam com mais sacrifícios. Daí que chantageiem os cidadãos com a falta de dinheiro para pagar vencimentos e subsídios. Daí que nos atormentem afirmando: "viram, o TC não nos deixou brincar aos subsídios e agora o nosso paizinho vai-vos dar tau tau".

 

Este não é um Governo de Portugal. Este é um Governo de ocupação. Precisamos como em 1383 de uma nova revolução. Não sei como, mas metaforicamente falando, precisamos de uma nova Aljubarrota. Portugal resistiu ao longo da sua longa história a muitos cativeiros. Saíu desses cativeiros com unidade, esforço e sacrifício. Tinha ocupantes declarados e assumidos. Mas neste cativeiro, os portugueses enfrentam um inimigo bem mais perigoso. Cínico, manhoso, escorregadio, mesquinho. Esperemos que não seja uma tragédia.

 

MG 

 

 

10 Abr, 2013

Just say no

imagem retirada da net

 

Não sei se estou enjoado se enojado. Depois do chumbo das normas do Orçamento do Estado pelo Tribunal Constitucional, levantou-se um batalhão de comentadores a considerá-lo um inimigo da Nação, fazendo coro com a reacção governamental. Obscuros opinion makers, saídos de esconsos buracos, vieram à luz do dia gritar aqui del rei que o país está perdido, por causa de ter uma malfadada Constituição. O homem de Belém, sem tino e sem rumo, logo deu o amém e carta branca ao governo para continuar em rota livre de colisão. O primeiro resultado está à vista. Esse exemplar, digno de estudo psiquiátrico, chamado Gaspar, paralizou o Estado.

 

Paul Krugman, reputado economista, laureado com o prémio Nobel foi curto e grosso. Dirigindo-se aos Portugueses, sobre a austeridade, deu o mote: JUST SAY NÃO (digam apenas não). De uma forma mais genérica "defende que a ‘troika’ é sádica e opta por um caminho errado. O economista e prémio Nobel afirma que foi dada autorização à ‘troika’ para continuar a provocar dor". O que mais terá que acontecer para parar a destruição da Europa?

 

MG 

10 Abr, 2013

A pata germânica

Parece que está claro. Esta sanha da Alemanha contra os países do Sul com o apoio tácito de alguns do Norte, tem um objectivo. Empobrecê-los, enfraquecê-los e depois colocar-lhe a pata em cima. É a via cínica, com capa democrática, da versão do espaço vital hitleriano embrulhada em prenda envenenada. Para isso dispôe dos seus homens de mão. Em Portugal tem nome: Gaspar. E ainda há quem se admire de Portugal não contestar as posições da Troika?

 

Para mal dos meus pecados acompanhei uma dama à capital. Acomodei-me no lugar do pendura e lá fui, pensando de mim para mim, "vamos lá ver se isto corre bem". Não correu! Diga-se em abono da verdade que não sou sexista, nem um bocadinho. Mas que há coincidências há.

 

Nada a ver com a condução. Admito que não faria melhor. O diabo está nos detalhes, melhor, no estacionamento. Contudo, parecia que começava bem. Parque pago, daqueles onde se põe umas moedinhas, lugares de fácil arrumação. Tudo preparado para dar certo. Arrumada a viatura para o merecido descanso, fomos à pata, numa missão quase impossível, procurar uma tela de bordar, que segundo consta, terá existido em tempos idos. Mas dama quando encasqueta  uma coisa nas meninges...adiante, corremos seca e Meca e objectivo zero. Muito mais previsível que as previsões do Gaspar. Fazer o quê?

 

Voltámos para retomar o recuperado carro. Ao aproximarmo-nos, deparámo-nos com uma situação insólita. O sortudo, estava a ser envolvido com uma fita colorida, assim a modos como aquelas que põem ao pescoço dos homenageados no dia da nação. Mas quando me aproximei vi que o infeliz estava a ser simultaneamente algemado, isto é já tinha uma roda bloqueada. Não batia a bota com a perdigota. No imediato, fiquei estupefacto, mas dentro das minhas limitações percebi, "não sei porquê mas estamos lixados".

 

A dama ainda correu apressada para junto dos cavalheiros que praticavam a má acção. "Mas eu paguei o estacionamento", balbuciou. Pois pagou, disse um calmeirão fardado a preceito, o problema é que estacionou num lugar proibido. "Mas isto não é um parque de estacionamento? Está ali a placa". É, respodeu sem respeitar a pontuação, com excepção deste lugar". A dama ainda tentou atirar com o chamado charme feminino para cima (salvo seja) do fiscalizador, dizendo: "eu venho aqui muito raramente e não me apercebi".  Não adiantou, o homem tinha sido programado para multar e não havia argumentos, por maiores que fossem, que o convencessem. Um funcionário exemplar. Merece ser recompensado no paraíso.

 

Fiquei calado que nem um rato e enquanto a dama pagava a multa, via multibanco, deslizei de mansinho até junto ao sinal de trânsito da entrada do parque. Verificado. Lá estava a cores e com todas as letras "proibido estacionar". Confirmado. Mulher não sabe ler sinais de trânsito. Voltei da minha discreta ronda e constatei que dois atarefados agentes, sentados numa secretária improvisada, dentro de uma carrinha que pedia descanso e caldos de galinha, daquelas que os ciganos usam nas feiras, lutavam com um computador portátil, que recusava aceder ao seu servidor para passar a multa. Continuei de bico calado, mas pensei: "há máquinas mais sensatas que os humanos". Por fim, um deles disse: passa a multa à mão. À mão, disse o outro, não sei, já perdi o jeito.

 

 

O senhor agente teve mesmo de meter mãos à obra .E nós à espera, que a coisa rendia! Enquanto preenchia o formulário com leves afagos e instruções via telemóvel, que com a precipitação deixou cair, divindindo-o em dois, o grandalhão desbloqueou a roda e aliviou a viatura daquele injusto castigo. Eu continuava mudo de nascença e a dama com cara de caso (ou de, casa) só dizia: Lá se foram oitenta euros (setenta da multa e dez para tirar o aparelho de tortura). Apenas por não saber ler sinais de trânsito. Moral da história: quem viajar com dama, previna-se. Nunca confie. É que há coisas que são genéticas e receio que não haja excepções.

 

 

 

MG

 

 

 

E nós à espera!

 

 

 

 

 

 

  

 

Passos Egas Moniz deu a sua palavra. Vamos cumprir custe o que custar. Cercado pelas lanças do império do prestamismo, prometeu que Portugal lhe prestaria vassalagem. Jurou que cumpriria todas as exigências e até muito  mais. Empobreceria os portugueses, destruiria o mercado interno, cortaria salários até onde fosse preciso. Cumpriu tudo à risca, mas foi traído. Os traidores juízes de fora, estribados na lei, puseram um travão ao saque dos despojos da nação. Passos Egas Moniz com a seu fiel aio, pôs uma corda ao pescoço e entregou a sua vida ao supremo magistrado. Como era de esperar da sua magnanimidade, foi perdoado. Teve uma dupla vitória. Tirou a corda do pescoço e colocou-a no pescoço do supremo magistrado, símbolo máximo da nação, ou seja colocou-a na garganta da própria nação. Lenda ou realidade?

O Relvas foi-se embora

E a vida pra mim mudou

O que vou fazer agora

Sem um clown para o show

 

As horas são mais sombrias

Os dias parecem anos

Foram-se as alegrias

De enganos e desenganos

Ficam as análises frias

Dos verdadeiros ciganos

 

Ó tempo volta pra trás

Ameniza a minha pena

Pois quero voltar a ouvir

Relvas Grândola morena

Á sombra de uma azinheira

Já só resta a saudade

De ouvir a versão foleira

Na voz da minha cidade

Ó tempo volta pra trás

Com toda a sabedoria

Eu prefiro ter o Relvas

Ao Cavaco e à Maria

 

Por que será que o Coelho

E o Gaspar não vão embora

E levam consigo o Portas

E a troika daqui pra fora

Porque para mim o Relvas

Porque para mim o Relvas

É o bobo inofensivo

Diverte a população

Contribui pro nosso riso

E eu ainda estou à espera

Que emendem o prejuízo

 

Diz-se que um relatório da inspecção da Educação encontrou ilegalidades na licenciatura do ex-ministro Relvas. Antes licenciado por uns dias que deslicenciado toda a vida. Seja qual for a consequência deste relatório, esse prazer ninguém lho tira. Relvas é o paradigma da chico espertice nacional. Não percebo tanta abespinhação. Com excepção de alguns parolos com a mania da honestidade quem não aproveitaria? Pergunto eu? Com toda a solidariedade tuga, aqui reponho estes versos que lhe dediquei no mês de Junho de 2012. Força camarada!

 

 

Ó Relvas, Ó Relvas

Diploma à vista.

És um artista

da oportunidade,

transportas o vício

da facilidade!

(três vezes)

 

Nascestes no mundo Jota

E nele foste formado

Para enganares quem vota

e chegares a deputado!

 

Ó Relvas, Ó Relvas

canudo no bolso.

És um colosso

da velocidade,

fizeste num ano

a universidade

a universidade

(três vezes)

 

 

Tens orgulho quando falas

da inédita formatura,

sem nunca teres ido às aulas

Tiraste a licenciatura!

 

Fizeste o curso com tento

e muitas dificuldades,

agora serves de exemplo

às novas oportunidades!

 

Ó Selvas, Ó Selvas

indígenas à vista.

És ciclo turista

de universidades,

quem tem olho é rei

nas minha cidades!

nas minhas cidades!

nas minhas cidades!

 

Poeta diplomado em equivalênias

01 Abr, 2013

Carta a Garcia

Meu caro dr. Medina Carreira

 

Vou escrever-lhe esta carta que seguramente não receberá. É até altamente improvável que tome conhecimento do seu conteúdo. O senhor paira num plano inacessível aos comuns mortais. Um lugar onde apenas têm assento semi-deuses da opinião. Contudo, quero acreditar que às vezes missões impossíveis podem ter êxito, como aconteceu com a entrega da carta a Garcia. Posso iludir-me, mas tenho que acreditar, que esta cairá em saco roto, e arrisco a dizer-lhe que o vejo na televisão apresentar sem contraditório a sua visão do mundo. Admito, que ultimamente, até me tem surpreendido com a abordagem de alguns temas interessantes, como por exemplo a situação da floresta, e que têm a virtude de fugir ao tradicional "economês" que pratica ritualmente.

 

Quero dizer-lhe, olhos nos olhos, que discordo, frontalmente, da forma como aborda a realidade, reduzindo-a a uma espécie de deve e haver. E digo-lho, porque a vida humana não se pode considerar uma máquina que se alimenta para produzir. Nem se pode resumir ao "só de pão vive o homem". Poderá não concordar, mas entendo, que se no inicio da génese humana, os protagonistas dessa aventura, se limitassem a produzir e a consumir nunca teriam passado da cepa torta ou seja da pré-história. O que irá distinguir o homem do animal, para além da capacidade de fazer, é o uso da linguagem, da escrita, da cultura. A partir daí, foi uma longa caminhada de constante aprendizagem e aperfeiçoamento, sujeita, naturalmente, a avanços e recuos.

 

Digo isto, caro doutor, para salientar, que tão importante, como a economia nas sociedades humanas, é a cultura, a religião e a política. Considero, que é esta última que permite ao Homem sair do caos e construir uma ordem fundamental para o devir. Foi neste contexto que chegámos à forma de organização chamada Democracia, émula do Estado de Direito, em que as leis escritas definem e limitam todos os vários poderes.

 

Com este arrazoado, pretendo dizer-lhe, que num Estado de Direito, a lei não hierarquiza os sectores, dando, por exemplo mais importância ao papel da economia, especialmente reduzida ao deve e haver. Mas é esta tese, que depreendo das suas opiniões, porque o senhor acha que o Tribunal Constitucional é um empecilho à governação. O seu argumento, se bem entendi,  é que este órgão não faz dinheiro e portanto não tem espaço para existir. Isto é não se encaixa na ideologia do deve e haver. Dizendo de outro modo, não cabe na sociedade do "economês". Com todo respeito e sem pôr em causa a sua inteligência, que não posso nem devo contestar, quero  dizer-lhe que está errado.

 

Eu sei que esta sua posição deriva do facto do Tribunal Constitucional considerar inconstitucionais normas do Orçamento de Estado, como aplicação de taxas extraordinárias sobre os vencimentos dos reformados, entre outras. Desculpe, mas o senhor põe, na minha opinião, o carro à frente dos bois e privilegia o infractor. Quem está a violar as regras é o governo e não o TC. E quando se coloca o deve e haver acima do primado da lei, entramos numa deriva perigosa, que em última instância, poderá levar ao regresso de um qualquer faroeste. E como o vejo como um homem culto e civilizado, tenho dificuldade em compreender a sua posição. E mesmo que reduzíssemos esta situação a uma questão da produção e distribuição da riqueza, deve saber, que não é a maioria produtora que mais recebe na divisão do bolo. Antes pelo contrário. Ou seja, quem gasta acima das suas possibilidades não são os assalariados, sem os quais a produção, bye bye, mas aquela minoria que se apropria, pelas mais desvairadas vias, da maior parte da riqueza. Chico espertismo ao fim e ao cabo. E isto acontece no Estado de Direito. Olhe se não existisse Estado de Direito, nem Tribunal Constitucional. Era o regabofe completo. Era a escravatura institucionalizada, sim,  porque a escravatura mitigada nunca acabou, nem acabará enquanto a distribuição da riqueza não for equitativa.

 

Fique bem, sobretudo com a sua consciência!

 

MG

 

 

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