A escritora Agustina Bessa Luís usou num dos seus romances que a história é uma ficção controlada. Completamente de acordo. Não é por acaso que a história está constantemente a ser reescrita. Mudam-se os tempos, sucedem-se as correntes historiográficas, alteram-se as ideologias dominantes e mudam as interpretações. Ora se dá mais importância aos heróis, ora se privilegia o papel do colectivo, ora se acentua a vertente política, ora se promove estrutura económica, ora se ignoram acontecimentos. Poder-se-á alegar que antes das interpretações estão os factos e que estes são incontestáveis. Não é verdade. Não há factos puros nem ingénuos. Os factos são criados por homens, reflectem subjectividade e parcialidade na melhor das hipóteses, pois muitas vezes são manipulados e falsificados. E quanto mais recuamos no tempo mais a efabulação se torna real. Toda a construção da história antes da escrita está alicerçada em indícios materiais sobre os quais se podem construir diversas fantasias. O que aconteceu realmente, ninguém sabe. Supõe-se. Até a explicação científica sobre a formação do universo levanta muitas interrogações. Se houve uma explosão inicial como se formou esse principio? Haverá um principio de principio? E por este caminho não chegaremos, em linguagem humana, a um beco sem saída? E se não podemos chegar ao princípio, como podemos imaginar um fim? Perguntas para as quais a limitada mente humana não tem respostas.
Do passado o que fica de objectivo é o conhecimento acumulado que usamos, nem sempre bem, no presente. Nesse sentido o passado dilui-se de forma quase imperceptível no nosso dia a dia, aquele que realmente vivemos.
Mesmo esse tempo a que chamamos futuro, não passa de um holograma do presente. Não passa de utra ficção que criamos na nossa mente de acordo com vivências, desejos, suposições. E invocar uma construção ficcional do passado para explicar o futuro, se não for intencional só pode ser ingenuidade. O retrocesso social do inicio do século XXI, por exemplo, era imprevisível na segunda metade do século XX. Pensava-se precisamente em sentido contrário. O que sabemos e sentimos de concreto é o que vivemos, segundo a segundo, porque a vida é presente, feito de pequenos nadas. A emoção do nascimento de um filho, a alegria da vitória do nosso clube, a tristeza de uma ausência. Um sucesso momentâneo, um fracasso repentino, uma discussão absurda. O canto de um pássaro na madrugada, o sabor doce de um fruto, o cheiro e a beleza de uma flor. A audição de uma música, a leitura de um poema, a fruição de de uma paisagem... E apesar do acaso que acompanha a vida, quero acreditar sem cientificidade e por simples intuição que a vida, como o cosmos têm um sentido. Nem sei qual, nem ninguém saberá. O que sei é que é bom viver, o que sei e acentuo é que a vida é feita de pequenos nadas.
MG