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Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

06 Dez, 2010

Desemerdem-se

 

 

Este é um país pequeno com a mania das grandezas. Ressalvando honrosas excepções, dignas de nota, quase sempre viveu, ao mais alto nível, na onda do improviso. Umas vezes deu certo, muitas outras deu asneira. A propósito, volto ao caso da vaca fria dos agrupamentos escolares, para que não caiam na penumbra da doença de Alzheimer. É um dos mais acabados exemplos da improvisação sem rei nem roque e da ideia peregrina que grande é que é bom. Eis o coktail: escolhe-se um determinado número de escolas aleatoriamente e manda-se que se agrupem. As suas direcções com a timidez própria dos simples e ingénuos, ainda ousam perguntar: Qual o objectivo? a resposta vem óbvia: para melhorar a qualidade do ensino, pois este só é eficaz em agrupamentos com tês mil alunos. Vencidos mas pouco esclarecidos voltam a interrogar: Como vamos proceder? A resposta ainda vem mais elucidativa: desemerdem-se. Conversa acabada.

 

O que se passou na Escola (agora agrupamento) Damião de Goes é paradigmático. Cumpriu-se a determinação, contra a vontade de tudo e de todos. Rectificando, assinalem-se algumas excepções: as daqueles sempre dispostos a vender a alma, mesmo que já não a tenham e a dos outros que apenas sabem correr  a favor do vento. A  maioria, triste e derrotada, vai aceitando e baixando os braços. O que pior pode acontecer é que aqueles que estão no caminho certo se sintam derrotados. A condição mais lamentável é auto considerar-nos Vencidos da Vida. Desses está o inferno cheio.

 

Saiam desse derrotismo. Indignem-se. Protestem. Resistam. Não sabem como sair disto? Unam-se no pensamento e na acção. Com inteligência toda a estupidez será vencida. Desemerdem-se, com organização, rigor e lucidez, mas desemerdem-se.

 

 

MG

 

 

05 Dez, 2010

Inocência

Para todos os aniversariantes de hoje e de todos os dias. Para todos os que tiveram ou não tiveram festas  de anos. Para todos os que foram crianças e que já não sendo, ainda o são, aqui deixo esta reflexão sobre a idade da inocência na pena de Álvaro de Campos ( Fernando Pessoa).

 

 

Aniversário

Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)

[473]

No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas
lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais       copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...


15/10/1929

04 Dez, 2010

Vigarice

Governo apanhado

de surpresa com

‘finta’ de César

 

 

Os Açores são uma das antigas parcelas do império português que ainda são território nacional, tão nacional como qualquer outro. Arquipélago de ilhas de belezas naturais e de gentes laboriosas. Os seus habitantes são cidadãos portugueses de pleno direito, sujeitos às normas da República Portuguesa.

 

O artifício inventado pelo Governo Regional para isentar três mil cidadãos (leia-se votantes) das medidas de austeridade previstas para o próximo ano pode ser legal (?)l, mas é profundamente imoral. Atropela um princípio básico de qualquer Estado de Direito: a igualdade dos cidadãos perante a lei. Chamando os bois pelos nomes chama-se VIGARICE e tem  um único objectivo: ganhar votos.

 

Esta monstruosidade precisa de ser travada. A não ser que este território insular já não faça parte da nação portuguesa. A ser assim  têm que ser imediatamente suspensas as verbas que recebe do Orçamento. Se não,  tem de ser o Governo da República  a pôr-lhe cobro, para que a classe política, já tão desacreditada, não seja de vez, associada a um conceito de pura banditagem.

 

MG 

 

Ernâni Lopes não era uma figura da ribalta. E tanto quanto se sabe nunca pretendeu sê-lo. Foi chamado a ajudar o seu país numa conjuntura extremamente difícil -  crise de 83. Como ministro das finanças, com trabalho, competência e seriedade pôs as finanças públicas em ordem. Negociou a entrada de Portugal da CEE e criou as condições para o desenvolvimento sustentado do país. Quando saiu de cena a casa estava arrumada. Serviu a política mas nunca pretendeu servir-se dela. Fez parte de uma geração de dirigentes que parece estar em vias de extinção. Ao contrário dos neogovernantes de todas as matizes das últimas décadas, que governam para clientelas e têm gastado à tripa forrra, pautavam a sua acção  pela trabalho , pelo rigor, pela honestidade, pela amor à causa pública . Ernâni Lopes, foi um desses  ministros sérios, que hoje partiu de consciência tranquila.

MG

 

 

02 Dez, 2010

Remake

ponteeuropa.blogspot.com

 

 

 

Os tempos estão difíceis. A Europa da riqueza e da prosperidade passa por uma crise económica, mas também identitária e existencial. Acreditou-se que esta prosperidade, construída sobre o usufruto  de dois terços da riqueza mundial, por um terço dos cidadãos do mundo era eterna. Puro engano. O mundo  mudou. Os países da Ásia acordaram do seu longo adormecimento. Estão na luta pela repartição do bolo e as fatias são cada vez mais pequenas.

 Por outro lado, a velha Europa deixou  a economia cair no liberalismo sem regras, na desregulação dos mercados financeiros, na ditadura dos especuladores e está num beco de difícil saída. As doença sente-se nos seus membros mais fracos mas atingirá todo o organismo se não for travada.

 

Eu já vi este filme noutros carnavais. Também o poderoso Império Romano se construíu sobre o expansionismo guerreiro, dominando todos os territórios à volta do Mediterrâneo. Baseou-se numa economia guerreira e esclavagista, onde a mão-de obra escrava, captada na guerra, garantia a produção de bens. Quando a expansão terminou e os escravos que asseguravam o trabalho começaram a escassear, começou a hecatombe. O consumo deixou de ser suportado pela produção e as condições de vida pioraram. Daí até  à instabilidade política  e à anarquia militar foi uma questão de tempo .O regime , incapaz de se adaptar à nova realidade, implodiu. 

 

A Europa, salvaguardadas as devidas distâncias, corre um risco idêntico se não arrepiar caminho. Ou se constitui como um corpo unido e coeso do ponto de vista económico e político, considerando todas as nações,  como parceiros iguais e úteis para conseguir adaptar-se aos novos tempos. Ou envereda, como parece neste momento, pelo caminho da divisão, deixando os mais fracos à mercê da economia especulativa e hipoteca a sua sobrevivência. O que vejo, é os actuais dirigentes europeus a digladiar-se como os imperadores da fase final do império romano. O que vejo é que os europeus e especialmente a classe política  não aprendem com as lições da história. Pior, será que chegaram a aprender história?

 

MG

01 Dez, 2010

Um dia diferente

Um dia diferenteFicheiro:Joao IV proclaimed king.jpgPintura alusiva à Restauração da autoria de Veloso Salgado

 

 

A manhã do dia um de Dezembro de 1640 estava fria e um pouco enevoada . Parecia ser mais um dia como tantos outros na vida do país ocupado. Na palácio do governo, a representante de sua alteza real Filipe IV , a duquesa de Mântua, preparavam-se para iniciar mais um dia de governação. Mas iria ser um dia diferente, o primeiro do renascimento da independência nacional. 

  Às oito horas, começaram a colocar-se, discretamente, junto do Paço os conjurados, como tinha ficado acordado. Era um grupo pequeno de cerca de quarenta nobres. Quando o relógio da Sé marcou nove horas, saíram dos coches,  desmontaram dos cavalos, dirigiram-se com determinação para o Paço, dominaram os desprevenidos guardas, entraram no gabinete do espantado secretário da duquesa, Miguel de Vasconcelos. Um tiro certeiro demitiu-o de imediato, enquanto a duquesa,  atordoada pela surpresa entrava na sala para ser imediatamente detida. Ao mesmo tempo que atiravam  o corpo exangue do secretário para a rua, D. Miguel de Almeida de espada nua nas mãos gritava, com a voz algo embargada pela emoção, para o povo que se começara a juntar:

 

-Liberdade portugueses! Viva el-rei, D. João o Quarto.

 

Nesse longínquo dia 1 de Dezembro Portugal voltaria a ser um país soberano. No entanto, a consolidação da independência custaria ainda muito suor e sangue. Só passados vinte e oito anos de luta armada e diplomática foi celebrado o acordo de paz com Castela.

Cerca de três séculos depois  o primeiro de Dezembro é apenas mais  um feriado para a maioria dos portugueses . O acontecimento que o proporcionou passa despercebido a muitos cidadãos. Os órgãos de comunicação social parecem desconhecê-lo. O poder político parece envergonhado em recordá-lo. Mas este dia e a acção corajosa dos conjurados foi determinante para que hoje sejamos uma nação independente no contexto ibérico e europeu, para além de  regimes e ideologias.

 

MG

 

 

 

 

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