Quem nunca se apaixonou por estrelas das galáxias das artes que atire a primeira pedra. Confesso, sem vergonha, que para esse peditório já dei. Confesso, sem arrependimento que sofri a tortura dessas paixões platónicas, porque na prática não são concretizáveis. E nem se quer se coloca a questão de serem ou não correspondidas, porque entre o cidadão comum e esse mundo estelar existem distâncias insuperáveis. É quase impossível aceder ao Olimpo onde habitam. Resta sonhar e sofrer no silêncio da nossa intimidade. Mas como em tudo às vezes acontecem excepções.
Foi assim que certo dia me cruzei com uma star, do teatro nacional, em carne e osso, por quem meu sofrido coração palpitava. Estava sentado a jantar com colegas de estudo, num restaurante credenciado, quando a dama saiu da sua nave prateada e entrou vaporosa e linda na companhia de outros astros do mesmo universo. Logo um solícito empregado (também apaixonado?) se lhe dirigiu com uma deferência de fazer inveja. Por momentos intermináveis desejei assumir aquele papel. Depois da surpresa inicial aspirei a colocar-me no seu horizonte visual. E como quem recebe um brinde de um deus generoso, a dama, ao passar pela minha mesa dignou-se, como numa atracção fatal, fulminar-me com o seu olhar de uma candura infinita. Aí, o meu coração disparou mais rápido que um carro de fórmula um, de tal modo que quase me saia do peito arfante. O meu rosto reflectiu incontroláveis emoções. Desde o vermelho vivo até ao branco robbialac, mostrou o catálogo de todas as cores do arco-íris. Sentada ao meu lado, uma companheira de mesa, das que estão sempre presentes, mas nas quais nunca reparamos, amparou-me para não me diluir no assento que me suportava. O meu coração tinha sofrido tão grande aceleração que a seguir quase parava.
Lentamente, fui-me recompondo com a ajuda e paciência de quem me acompanhava. O prozac natural de graduação etílica elevado foi-me trazendo de volta ao mundo terreno do nosso contentamento descontente. Mantive-me firme. Não abri o jogo. Ninguém ficou a saber o motivo da minha abrupta indisposição. Muito menos a causadora involuntária da situação. Espero que quem, agora, ficar a saber. não dê com a língua nos dentes! Até porque esse amor não se concretizou, mas teve o mérito de despertar em mim o poeta escondido. De facto desse encontro nasceram estes versos de coração quebrado, que dedico a todos os apaixonados mal correspondidos (ou não):
Por causa dela,
Mas só por causa dela,
Meu coração bateu tanto
Que partiu uma costela!
Toda a minha juventude
Metido numa ilusão,
Foi com a sua lembrança
Que venci a solidão;
Nas noites escuras e frias,
Guardei sua imagem bela
E sobrevivi aos dias
Mas só por causa dela:
Sempre no meu pensamento,
Passei tempos a sonhar,
E concretizei o meu intento
Quando a pude encontrar;
Encontrá-la foi um espanto,
Enfrentá-la uma mazela,
Meu coração bateu tanto
Que partiu uma costela!
Cronista apaixonado