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Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

 

Tenho de me render à evidência. Estou mesmo a ficar velho. E digo-o porque me estou a transformar-me num bicho de rotinas. Foi assim que ontem por ser domingo e querer fazer um parêntesis numa semana sem horizontes, me vi novamente aterrar nas Caldas da Rainha, aonde ainda há pouco tinha estado. Por outro lado, a ida a esta cidade teve o condão de me distrair do quotidiano pobre e das lutas de alecrim e manjerona entre Álvaro e Gaspar e poder mergulhar no Portugal profundo. Mais uma vez passeei pelo mercado ao ar livre entre cenouras, muitos grelos, alguns nabos e fruta para todos os gostos. Aproveitando a oferta dos vendedores “prove esta maravilha” lá fui experimentando sabores à conta da generosidade da gente genuinamente portuguesa. E entre o doce da tangerina e o ácido do limão veio-me à porta da memória uma canção popular dos anos 60, chamada “Rosinha dos limões” da autoria de Artur Ribeiro. Trancrevo este excerto: 

Passa ligeira, alegre e namoradeira,

E a sorrir, p'rá rua inteira, vai semeando ilusões.

Quando ela passa, vai vender limões à praça,

E até lhe chamam, por graça, a Rosinha dos limões.

 … Quando ela passa, apregoando os limões,

A sós, com os meus botões, no vão da minha janela

Fico pensando, que qualquer dia, por graça,

Vou comprar limões à praça e depois, caso com ela!

Depois, por associação, lembrei-me de quando nos esperançosos anos 70, passou por mim no rossio uma mocinha ainda a desabrochar mas já com diploma da universidade da vida, a querer vender-me rosas. Lá fui educadamente dizendo que não precisava, e estugando o passo. Enquanto me afastava, algo aliviado, ouvi a sua voz dizer “ anda cá que eu ofereço-tas”. Esta cena ficou registada na gaveta do arrependimento, pois foi a primeira e a última vez que uma desconhecida por impulso me ofereceu flores e que por embaraço e atrapalhação não aceitei .Ontem quando passava junto à banca das flores, a caminho da feira anual de velharias, ainda olhei, de soslaio, para ver se havia alguma jovem a oferece-las mas não, apenas divisei uma matrona com saudades dos anos 70. Avancei. Ali ,no meio de muitas bugigangas descobri numa exposição de livros, uma capa desbotada pelo tempo onde se lia “gramática da língua portuguesa”. Folheei e comprovei que os substantivos se chamavam substantivos e não nomes epicenos ou contáveis e não contáveis, os adjectivos, adjectivos simplesmente e não”radical adjectival” e não havia nenhum “verbo abundante”, nem sujeitos expletivos, ao invés do que acontece na gramática generativa ou degenerativa (que não para de degenerar) ou na moderna tlebes. Mas isto é na feira de velharias. Por fim, agarrei num velho dicionário e procurei o significado de excepção. Deu: desvio da regra geral, restrição, privilégio. Ai fiquei mesmo baralhado. Então porque raio é que o ministro Relvas que julgava que era dos Assuntos Parlamentares e pelos vistos também é especialista de língua, afirmou que excepção (a propósito dos não cortes de vencimentos na TAP, CGD...) significa adaptação . Se calhar está a construir um novo dicionário. Se assim for ainda bem. É que já estou a ver que em vez de me chamarem preguiçoso e enfezado latino do sul, passam a chamar-me adaptado de laborioso e matulão bárbaro do norte. De repente ganhei estatuto. Afinal já não sou uma velharia. Oh, Relvas…corta! Na próxima ofereço-te um Zé povinho adaptado ao que mereces: toma=rua!

MG

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