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Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

Nação valente, ao sul

Odeleite Cabeça do dragão azul

25 Nov, 2011

Memórias

O senhor Simplício era professor e teria sido em tempos poeta popular, se esta designação existe para os deuses dos poetas. Conheci-o no poente da idade. Tinha uma pequena escola de ensino liceal, com paralelismo pedagógico, numa aldeia perdida da serra algarvia. Era director, professor de todas as disciplinas, contínuo e administrativo. A escola funcionava numa dependência da casa de uma senhora solteira de boas famílias e de quem o senhor Simplício constava ser hóspede. Mas dizia-se à boca cheia que viviam de casa e pucarinho

Filho de gente pobre, foi muito novo para o Seminário, mais do que para servir ao Senhor, para fugir à vida madrasta do campo. E se novo entrou na carreira religiosa novo saiu dela, pois abandonou os estudos antes de tomar ordens eclesiásticas. Até regressar à sua  aldeia com cabelos brancos, andou por esse mundo, dizia-se, ao deus dará. Esse período da sua existência confundia-se até com uma lenda. Constava que sofrera grande desgosto e fora gastando a sua vida na boémia, cantando e dançando sabe Deus por onde. Falava-se, que sempre acompanhado de uma guitarra, cantava de terra em terra as suas mágoas em poemas da sua autoria.

Na fase em que fui seu aluno, apenas lhe conheci a faceta de professor austero e competente. Dizia-se que nos exames de final de ciclo no Liceu de Faro, os seus alunos eram os mais bem preparados, com algumas excepções (mea culpa). Quanto à poesia apenas se fazia menção a uma cantiga que se cantava nos bailes e que seria se da sua autoria. Em sua memória, pelas gerações que formou e pelo muito que me ensinou, aqui a reproduzo como a ouvi.

 

 

Por causa dela,

Mas só por causa dela,

Meu coração bateu tanto

Que partiu uma costela.

 

Toda a minha juventude

Metido numa prisão,

Foi com a sua lembrança

Que venci  a solidão;

Nas noites escuras e frias,

Resisti na minha cela

E sobrevivi aos dias

Por causa dela,

Mas só por causa dela

 

Sempre no meu pensamento,

Pequei para a procurar,

Mas gorou-se o meu intento

Já não a pude encontrar;

Minha vida foi um pranto,

E tudo por causa dela,

Meu coração bateu tanto

Que partiu uma costela.

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